Postagens

Mostrando postagens de setembro, 2012

a linguagem como recusa

Do querer - a fala recusa a tradução. Do desejo, o oposto advém. Não vou dizer o contrário. Não vou dizer! Digo somente quando recuso o dito, e é mesmo na recusa que comparece o que iria a ser. Enfim, melhor seria dizer – digo NADA. Digo nada como quem diz algo que é nada; a recusa está no presente; a ausência é nítida e não digo o contrário. Não digo o contrário, já que o que digo já é o avesso da linguagem: digo NADA. Só há linguagem quando NADA diz além.

um-mais-além

O esquecimento é muito mais! Esquecer demonstra bem mais que o óbvio - o dito acaso é uma ocorrência de um-mais-além do discurso, ou seja, não há acaso. Lapsos, esquecimentos, ironias ou piadas são resquícios de algo não dito, um-mais-além do discurso. Ler Clarice Lispector é deparar com todo esse universo. E não é à toa! As formações poéticas estão completamente interligadas com as formações do inconsciente, já que possuem os mesmos pilares: metáfora e metonímia. Enfim, no esquecimento, nos chistes, nos lapsos, nas embromações, há sempre um-mais-além do discurso. 

da leitura

Ler um livro é transar com a obra! Os leitores que leem de forma distante, procurando observar apenas a forma, sem se colocar ali (sem depositar algo seu naquilo que é lido) fazem uma leitura no mínimo superficial. Não me interessa a leitura sem o corpo a corpo - obra/leitor. 

do câncer, do suicídio

Há sempre um marimbondo rondando pela árvore genealógica de cada um. A maldição é lançada pelas figuras parentais, diante de um passado mal contado, uma história de repetição. O câncer, o suicídio, não há nada por acaso quando a questão é a subjetividade. A infelicidade da alma, a repetição de nossa ancestralidade, é um grito por socorro que poucos escutam. Olhar o marimbondo de cada um é uma possibilidade de escapar da insígnia pré-programada do destino: uma (re)invenção possível.

Santo Antônio de Goiás

Imagem
Na terra dos Antônios terra fantástica dos poetas Bacco tomará o rumo do além E Apolíneo, mais uma vez morrerá nos braços de ninguém Na subjetividade do poeta rumaremos à utopia e Marx -lukács serão nossa companhia Sentados frente à frente lado a lado ou em pé que entre o primeiro Antônio Bacco , de Michelangelo

Disparate

A vida como arte um mártir longe do abate A vida num encarte somente em partes rumo aos trilhos do infarte

Do ódio, do amor

Ódio, velho primo-irmão do amor - companheiro fiel do tesão!

Funeral na linha: olha o gol!

Pedro aguarda o amigo um amigo visto pela primeira vez cinco e meia, seis, sete, oito e nada - Ei, fio, meu menino já vem, sossega! - uma mulata dos quarenta grita da varanda. O rapazote aparece sem muita crença no jogo. - Oi! -Qual é o seu nome? - João Marcos. Sem palavras, a bola dança sem reclamar: de um lado a outro - um novo enfeite. Letra, calcanhar... A bola se enfeita toda e vai ao encontro dos pés descalços. Como um capoeira que não cai, que ginga sem atacar verdadeiramente, a bola procura o pé amigo. De tênis, descalço, de letra, calcanhar... - Ah, vamos ficar só assim? Pergunta Pedro, como quem diz que mesmo aos cinco era tão bom quanto o rapazote de oito anos - queria desafios. A bola amiga, então, passa à trapaça, ao drible brasileiro. A angola já regional! -Qual é o seu nome, hein? -Quê? Ah, Pedro Rafael. -Joga no gol, Pedro? Eu já quase fiz um gol de bicicletinha, sabia?! O caçador procura a toca. Toca a bola para si mesmo rumo ao gol. E a perm...

Ah, meu pai!

Essas cabrochas feitas do campo de chão vermelho e roupas rotas que acordam cedo ao canto do galo são belas de lamber os beiços De olhar penetrante cheiram a vizinhança café-fumê arrepiam até o mais brabo touro sertanejo e na lida diária lavam a relva com um cantar sem jeito de sofrido Ah, meu pai! Se nascido e crescido fosse... se meus pés tivessem os calos de milhões de espinhos... Ah, meu pai! eu tomava por esposa essa brabeza que sentada à porta, às seis me esperaria quente ao jantar!

Com o tempo aprende!

Com o tempo aprende! Aprende que nem todos perseguem sua doce família, seu emprego, sua vida. Com o tempo se percebe que o que unifica o eu também o engessa. Aprende que a defesa excessiva não advém simplesmente da postura do colega ao lado, mas, tão somente, do próprio olhar - o olhar invertido de si mesmo perante as adversidades da vida. A megalomania e sua irmã paranoia são resquícios de uma infância não superada, um narcisismo de morte em vida adulta. Enquanto não enxergar que essa defesa excessiva do eu é um dilema, o sintoma continuará: ora em casa, ora na casa do vizinho, ora o amigo, ora inimigo. E não percebe que o estranho é o mais doce familiar.

manjar de Exu

rei, jamais fantasma (poesia - a terrível aposta infernal da linguagem) boto a mesa sem almoço e confio no manjar no jantar, abro a mesa na encruzilhada (o jantar está posto!) e, ao longe, arriba o cajado de Exu! !      !      ! !      !      ! !------!------!        !        !        !        !

cinema hollywoodiano

escrevo em versos somente pela licença porque não preciso pedir licença (é poético!) digo como muitos esfacelados com a mesma fome da sua mãe (seu pai morreu e ela quer sexo!) e transo e durmo mas a licença me permite dizer sem avessos ir ao encontro de minha humanidade sem desvios o que até os mais próximos têm medo de falar os poetas (sob as asas da poesia) gritam o mesmo grito de milhares de anos enquanto silenciosos mortais se apagam em filas de cinema hollywoodiano